TRAGÉDIA EM CAMPO GRANDE: Rompimento de adutora alaga casas e arrasta carros em Campo Grande




Bombeiros foram acionados e técnicos da Cedae trabalham para conter o vazamento. Criança de 3 anos identificada como Isabella Severo dos Santos morreu afogada


     Rio - Uma adutora de grande porte da Cedae explodiu e interditou a Estrada do Mendanha, na altura da Rua Marcolino Costa, sentido Avenida Brasil, no início da manhã de terça-feira (30/07). Este é o principal acesso ao Centro de Campo Grande, para o motorista que vem da Avenida Brasil. Uma criança de 3 anos identificada como Isabella Severo dos Santos morreu afogada.
Ela chegou a ser encaminhada ao Hospital Estadual Rocha Faria, em Campo Grande, mas não resistiu e faleceu.




Bombeiros usam bote para circular por rua alagada após rompimento de adutora
Foto:  Severino Silva / Agência O Dia

    Toda a região ficou alagada. Várias casas foram destruídas. Carros ficaram submersos. A água chegou a 1,5 metros de altura. Estima-se que o jato de água disparado durante o rompimento tenha alcançado 20 metros de altura. Moradores se protegeram subindo nos telhados de suas casas. Bombeiros e CET-Rio estão no local. 
     Técnicos da Cedae trabalharam no local. Segundo a concessionária, o registro da adutora de grande porte foi desligado e a água foi manobrada para outras adutoras que passam pela região. A Cedae afirma que a população de Campo Grande não será afetada com a falta d'água, pois a adutora não era responsável por fazer o abastecimento das casas.




Rompimento de adutora assustou moradores de Campo Grande
Foto:  Reprodução TV Globo

     Segundo Almir Moura, gerente da regional oeste da Cedae, a adutora que se rompeu faz a ligação entre o reservatório de Marapicu e o Centro da cidade. "Recebemos uma ligação de um morador, às 5h40, informando sobre um vazamento no local. Vinte minutos depois, às 6h, houve o rompimento", afirmou.
     De acordo com Almir, ainda não é possível precisar a quantidade de água lançada nas ruas. A linha rompida vai até o Centro e por conta da interrupção no fornecimento de água, o abastecimento na região central pode ficar comprometido. A Cedar pede que a população economize água.
     De acordo com a assessoria de imprensa da Light, com a explosão da adutora, a rede da concessionária foi atingida e danificada. Por conta disso, parte de Campo Grande ficou sem energia. Segundo a concessionária, técnicos trabalham no local para restabelecer o fornecimento.
     Este é o segundo problema com adutora da Cedae num espaço de tempo de 15 dias. No último dia 15 de julho, conforme O DIA 24 Horas registrou, na Zona Norte, a Avenida Brás de Pina voltou a ser interditada, no cruzamento com a Rua Guaporé, na Penha Circular, devido a um afundamento de pista.
     A via tinha sido interditada no sábado, 13 de julho, foi liberada na segunda-feira, 15, mas voltou a ser interditada no mesmo dia, por volta do meio-dia, para a realização de uma obra emergencial. Houve rompimento de uma adutora e problemas nas obras de drenagem na da Zona Norte.
     Equipes do setor administrativo e patrimonial da Cedae estiveram no local fazendo o levantamento dos danos causados aos moradores, que perderam casas, carros, entre outros bens. A Cedae não soube explicar porque duas adutoras da companhia apresentaram problemas em 15 dias.
'Perdi tudo, minha casa acabou', diz vítima de alagamento
O mecânico Adilson da Silva Serpa, de 42 anos, teve a casa destruída após o rompimento da adutora. Ele estava em casa com a enteada Lavínia dos Santos Moura, 8, a esposa Ana Paula dos Santos de Oliveira, 32, e o cunhado Daniel Alberto. A família acordou por volta das 5h30 assustada com um barulho de água caindo no telhado de sua casa, na Rua Projetada A. 
"No começo achamos que era chuva. Mas o barulho não diminuiu e as telhas começaram a quebrar. Fomos para o segundo andar e quando abrimos a porta do banheiro vimos as paredes caindo. Logo em seguida um jato de água jogou todos nós para da casa fora", contou Adilson.
De acordo com o mecânico, a família foi resgatada com auxílio de um bote. "Depois que caí na água não vi mais nada. Foi um desespero tremendo. Perdi tudo. Quatro carros foram destruídos. Terei que construir tudo de novo, minha casa acabou", lamentou. O cachorro da família, segundo ele, ainda não foi encontrado.
Adilson disse que há dois meses uma empresa particular realizou serviço de terraplanagem exatamente no local onde a adutora de rompeu.

Cedae diz que vai ressarcir famílias após rompimento de adutora
     A inundação deixou um saldo de 70 desalojados, 72 desabrigados e 17 casas desabaram. No total 14 pessoas ficaram feridas e a jovem Isabela Severo dos Santos, de 3 anos, morreu.
     O diretor de operações da Cedae, Jorge Briard, informou que a empresa e o governo do estado irão indenizar todos os moradores atingidos. Eles serão transferidos para hotéis ou motéis, perto de suas famílias, e receberão alimentação e cuidados médicos.
     "Vamos analisar o que foi perdido e atingido. As equipes de manutenção e obras já estão vistoriando as casas para avaliar como elas eram antes de ser atingdas. Vamos reconstruir as casas e deixá-las como antes do acidente", prometeu.
De acordo com Briard, a Cedae está redistribuindo a água para outras adutoras para que não haja desabastecimento. Ele informou ainda que não há estatística de vazamento de grande porte na adutora e "foi um acidente pontual". Técnicos da empresa estão no local para recolher material e analisar o que provocou o rompimento.
     O motorista Jorge Luis Carvalho estava em casa com a mulher e os quatro filhos no momento do acidente. "A força da água era tanta que fomos até a cozinha e conseguimos nos segurar na geladeira, que boiava. Foram duas horas embaixo d'água, lutando com a minha família, Quase mataram todos. Isso é negligência da Cedae que não fechou a água na hora certa", acusou. O morador, de 43 anos, disse  que o rompimento da adutora já era uma tragédia anunciada. Segundo ele, uma draga operava por cima do duto que estava em obra. Ele acrescenta que os moradores da rua já estavam com medo de que acontecesse algum rompimento. "É um absurdo um descaso com a gente que é pobre, se isso acontecesse com um empresário mandariam um helicóptero para resgatar".
     O corpo da criança de 3 anos, que morreu por conta da inundação na rua, ainda está no necrotério do hospital Rocha Faria e deverá ser transferido para IML de Campo Grande. Uma equipe de médicos, assistente social e uma advogada da Cedae estão no hospital para acompanhar os feridos. A assistente social da Cedae tentou falar com o pai e a mãe da criança, mas eles não quiseram falar nada sobre o caso. A Cedae informou que vai pagar o funeral e o sepultamento da vítima. 
O coordenador de medicina da Cedae Ronaldo Turano já conversou com o vice-diretor do hospital, onde as sete vítimas estão internadas, e afirmou que se fosse necessário faria a transferência dos feridos para uma unidade particular Mas vice-diretor disse que não haveria necessidade, já que não tem nenhum ferido em estado grave.  

'A perda de uma criança é irreparável', diz Cabral

     O governador Sérgio Cabral foi até Campo Grande nesta terça-feira para acompanhar os trabalhos dos bombeiros e dos técnicos da Cedae. No local houve uma inundação ocasionada pelo rompimento da adutora Henrique Novaes. A jovem Isabela Severo dos Santos, de 3 anos, morreu afogada. "Casas se reconstroem, objetos se compram, mas a perda de uma criança é irreparável. O governo irá prestar todo solidariedade a estas famílias que foram tomadas de pânico e terror com o rompimento da adutora", disse Cabral.
     O governador foi hostilizado por moradores. Ao lado do prefeito Eduardo Paes, Cabral concedeu uma entrevista coletiva na Escola Municipal Casimiro de Abreu, que fica na área atingida pelo vazamento. No local, moradores exibiram cartazes contra os políticos e gritaram "Fora Cabral". Uma moradora chamou o governador de covarde. "Esse problema na adutora é recorrente, as enchentes são constantes. Aqui falta infraestrutura, iluminação decente, calçadas e asfalto", disse Osana Pedro Silva, de 36 anos.
     O prefeito Eduardo Paes também prestou solidariedade às vítimas. "O primo da menina Isabela trabalha conosco como assessor. Vamos tentar encontrar aleternativas para essas pessoas e olhar para as razões do acidente", afirmou.
Segundo o subsecretário de Defesa Civil, Marcio Motta, 20 casas foram destruídas e 200 atingidas em três quarteirões.
Obra de terraplanagem da Guaracamp pode ter causado rompimento 

     A delegada assistente da 35ª DP (Campo Grande) Tatiene Damares, que está coordenando as investigações do rompimento da adutora de Campo Grande, afirmou que já ouviu cinco testemunhas e que a hipótese mais enfatizada é de que a causa do rompimento seria a realização de obras de terraplanagem da Guaracamp no local.
     "A pressão do peso dos equipamentos pode ter afetado a tubulação debaixo e provocado a pressão na adutora", disse. Ela acrescentou que vai intimar o engenheiro das obras da Guaracamp e solicitar a escritura e os documentos do terreno. A delegada também trabalha com a hipótese de que a Cedae teria feito uma emenda na adutora há 2 meses. A empresa negou a afirmação de Damares em nota. "Quanto à informação de que teria sido realizado reparo na adutora recentemente, a Cedae afirma que jamais houve qualquer conserto porque nunca houve necessidade – a tubulação não havia apresentado nenhum vazamento anteriormente. A companhia não havia recebido nenhum chamado da região sequer para reparos em tubulações 'finas', ou de menor porte, como os ramais domiciliares", narra techo do documento.
Peritos do Instituto de Criminalística Carlos Éboli já fizeram perícia no local. A polícia solicitou agilidade nos resultados e disse que pretende ouvir mais moradores afetados, inclusive os pais da criança de 3 anos que morreu por conta da inundação.

Prefeitura inicia cadastro de famílias desabrigadas

     A Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social já cadastrou 17 famílias desabrigadas para ficar no hotel Hotelon, no Centro de Campo Grande, na Zona Oeste.  A Cedae informou que cerca de 70 pessoas já estão hospedadas em dois hotéis na região central de Campo Grande. Ao todo, 86 famílias ou 230 pessoas ficaram desabrigadas, mas as demais optaram por ficar na casa de familiares. Já não há mais nenhuma família abrigada na Escola Municipal Casimiro de Abreu, onde as vítimas do vazamento foram atendidas.
     "A hospedagem e todas as refeições dos moradores nos hotéis serão totalmente custeadas pela Cedae. Além disso, psicólogos e assistentes sociais do quadro da companhia prestarão atendimento diário às vítimas. A Cedae também vai arcar com todos os custos do enterro da menina Isabela Severo dos Santos", informou em nota. Cerca de 138 atendimentos médicos já foram efetuados na Escola Municipal Casimiro de Abreu. A Estrada do Mendanha, inteditada desde às 7h20 na altura da Rua Marcolino da Costa, foi liberada por vola das 19h10.

Defensoria Pública vai garantir indenização

     O defensor público do Núcleo Especializado de Defesa do Consumidor (Nudecon), Eduardo Tostes, está com uma equipe da defensoria pública para fazer a intermediação entre os moradores e a Cedae. Segundo a coordenadora do núcleo, Alessandra Bentes, a ideia é chegar a um acordo extrajudicial que garanta o ressarcimento justo e rápido para todos os atingidos pelo acidente - familiares da menina Isabela Severo da Silva, feridos e pessoas que tenham sofrido prejuízos materiais -, além de assistência imediata aos desabrigados.
     "Vamos primeiro garantir o mínimo de dignidade dos moradores, o que é mais necessário, como vestuário, moradia e alimentação. Posteriormente, vamos garantir os bens materiais perdidos. Queremos tudo formalizado e homologado, nada de boca-boca, para garantir a segurança das vítimas", informou Tostes.
     O diretor jurídíco da Cedae, Sérgio Pimentel, disse que, até o momento, 17 casas foram destruídas. Ele informou que a Cedae tem até sexta-feira para fazer o levantamento de toda a destruição e que todos os moradores serão levados a uma loja de departamento para comprar os objetos que foram perdidos. Pimentel acrescentou que o local será analisado para ver se as casas poderão ser construídas no terreno que foi inundado. "Não dá para saber ainda se as casas estavam na faixa de domínio permitida", concluiu.

Registro só foi fechado duas horas após estouro em adutora

     Pelo barulho na telha da casa número 22 — que foi destruída — da Estrada do Encanamento, Vagner Gonçalves, 29 anos, achou que se tratava de uma chuva de granizo. Mas ficou desesperado quando, da varanda, viu que o que lhe acordara pouco antes das 5h não era um fenômeno da natureza, mas negligência ou descaso de alguém. Segundo testemunhas, a água começou a destruir as casas por cima. Além do rompimento do cano de quase dois metros de diâmetro, a demora da Cedae em fechar o registro para interromper o jato teria agravado a tragédia. Alguns não tinham como sair dos cômodos submersos e ficaram boiando enquanto esperavam socorro. “Fiquei desesperado. Enquanto colocava as coisas no alto, o segundo andar desabava. Só tive tempo de sair e correr para lugar seguro”, contou Vagner. Ele morava em frente ao local de rompimento. “Só deu para salvar documentos”, acrescentou a mulher dele, Marlucy Ferreira, 38, diante do Chevette 1988 destruído.

Desespero e prejuízo

     Para sobreviver em meio à repentina enchente, eletrodomésticos foram usados como boias. O motorista Jorge Luis Carvalho, 43, colocou os quatro filhos e a mulher apoiados na geladeira, que estava ‘à deriva’ na cozinha. “Foram duas horas debaixo d’água lutando com a minha família para sobreviver. Quase mataram a todos por negligência. Foi uma tragédia anunciada. Por que a empresa demorou a fechar o registro, queria mais mortes?”, perguntou o motorista, revoltado. 
    Para a família de Agílson da Silva Serpa, 42 anos, a batalha foi longa. Em sua casa dormiam sua mulher, Ana Paula dos Santos, 32 anos, a enteada, Lavínia, 8, e o cunhado, Daniel Alberto. Todos tiveram de lutar contra a correnteza, que levou a casa e quatro carros. “Só tive tempo de ir para o banheiro do segundo andar com todos. Quando vi que tudo ia desabar, corremos e a água nos lançou na rua. Segurei numa viga, minha mulher pegou a filha e agarrou parte de parede”, lembrou Agílson, com ferimentos no rosto, braços, mãos, pés e pernas. 
A comerciante Maria de Socorro Araújo, 62 anos, que morava na casa 21, não acreditava. "Parece que passou um tsunami. Perdi meu bar, que construí ao longo de 16 anos. O sofá da vizinha veio parar na minha cozinha”.

Comissão cobra, mas fica sem resposta 

     A Cedae deixa sem resposta adequada há cinco anos uma solicitação da Comissão Especial de Saneamento da Câmara de Vereadores do Rio. A empresa deveria informar o plano de modernização das redes de água da cidade. Na época, um ofício assinado pelo presidente da comissão, o vereador Carlo Caiado (DEM), chegou a ser intercedido pelo Ministério Público Estadual, que exigiu esclarecimentos da empresa. Um documento emitido pela Cedae, em resposta ao MP, apontava apenas questões genéricas, como a extensão das adutoras na cidade — era de aproximadamente 9 milhões de metros— e o material empregado nelas. Nenhum projeto de modernização foi apresentado.
“Recebíamos reclamações de adutoras. O MP chegou a pressionar a Cedae sobre o plano, mas no fim, arquivou o processo”, explicou Caiado, que vai recorrer de novo ao MP para obter detalhes das adutoras, como idade de cada uma e a previsão de modernização.

Moradora diz que canos vazam há muito tempo no bairro 

     As residências foram inundadas tão rapidamente que muitos moradores nem tiveram tempo de deixar os cômodos onde dormiam e o jeito que encontraram foi ficar boiando à espera de socorro. Alguns ficaram ilhados mesmo depois que o jato d’água foi desligado pela Cedae e os bombeiros tiveram que resgatá-los de bote pelas ruas. 
     Jorge Biriard, diretor de operações Cedae disse que “a adutora não tem histórico de rompimento deste porte e não tinha nenhuma manutenção programada por outros problemas”. A moradora Osana Pedro Silva, 36, disse que os canos estavam vazando há muito tempo. É um descaso”.

FONTE: O DIA ON LINE


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